CÉSAR AUGUSTO MOREIRA BERGO
CORECON-DF Nº 5661
No mercado de capitais, a partir da última década do século passado, surgiram novos processos com foco em uma gama de procedimentos relacionados, principalmente, com a governança corporativa, compliance, controles internos e o risco operacional. Em um plano geral, podemos afirmar que todos esses processos visam possibilitar o equilíbrio do ambiente de negócios, bem como reforçar os aspectos ligados aos interesses de cada um dos agentes econômicos, que precisam ser adequadamente atendidos, a saber:
- Famílias e sociedade: garantia de renda, maior taxa de poupança, investimentos em infraestrutura, inovação e estabilidade econômica.
- Investidores: maior opção e diversidade de investimento, melhor critério de seleção de projeto, melhor precificação e maiores taxas de retorno, mercado secundário com liquidez, adequação de prazos e taxas.
- Empresas: base de investidores maiores, menor custo de intermediação financeira, inovação, melhores instrumentos de financiamento.
- Governo: maior liquidez e menor custo para financiamento da dívida pública, curvas mais longas facilitando a transmissão da política monetária para a economia real.
O esquema abaixo mostra o funcionamento do mercado e como ocorre a inter-relação entre os diversos agentes econômicos:
Com efeito, poderíamos trazer à discussão o histórico dos acontecimentos de outras nações, mas a atuação dos agentes de intermediação do mercado de capitais local, com destaque para os Bancos de Investimento, Corretoras e Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários, sob a tutela da Comissão de Valores Mobiliários, tem ensejado uma gama de instrumentos e veículos de investimento e de financiamento que, a cada ano, consolida a tão almejada perspectiva de crescimento e desenvolvimento econômico e de geração de emprego e renda.
As consequências positivas para o governo seriam observadas na melhoria da eficiência das políticas fiscal, monetária e cambial, além de proporcionar o aumento da arrecadação e redução de despesas. Para os investidores, podemos apontar as vantagens da melhoria na educação financeira com perspectiva de melhor rentabilidade dos investimentos, redução de risco e adequada diversificação. E para melhoria do cenário do mercado de trabalho, este ambiente é altamente propício ao fortalecimento do mundo corporativo, eis que induz as empresas a terem maior produtividade e buscar a melhora na qualidade de sua gestão, com incentivo ao planejamento de longo prazo abrindo espaço favorável à inovação.
Especificamente com relação ao mercado de trabalho vale dizer que, no presente momento, é provável que eu, você e mais alguém estejamos trabalhando em uma atividade fadada a desaparecer e às vezes não nos apercebemos até que finalmente entramos nas estatísticas do desemprego. Com certeza, o problema poderia ser contornado se cada um de nós tivéssemos a coragem de tomar as decisões corretas na época oportuna. Porém, este acontecimento não é privativo de uma única pessoa, mas de um coletivo pois a realidade demonstra que não existem outros trabalhos disponíveis na área que escolhemos para atuar. A dinâmica do mercado faz com que esses postos de trabalho se tornem cada vez mais escassos.
Tudo isso porque o centro de gravidade do emprego nas últimas décadas está se transferindo, rapidamente, de trabalhadores manuais e burocráticos, para trabalhadores com conhecimento, que resistem ao modelo de comando e controle que os negócios assumiram no passado.
A economia, também, exige mudanças, especialmente no que diz respeito à necessidade de as grandes organizações inovarem e de se tornarem empreendedoras. Mas é a tecnologia que exige e exigirá mudanças ainda maiores e, conforme os avanços, as novas fronteiras do conhecimento se tornam prevalecentes. Nós, economistas, como cientistas sociais que também somos, temos que nos engajar mais intensamente nas análises e diagnósticos para não correr o risco de sermos simplesmente atropelados pela dinâmica dessas novas circunstâncias.
Para exemplificar, temos que, até bem pouco tempo, a maioria dos usuários dos recursos de telemática fazia uso das novas tecnologias apenas para acelerar o que sempre fizeram antes no processamento de dados numéricos convencionais. Mas hoje, o foco foi colocado na informação, com impactos diretos nos processos decisórios, estruturas gerenciais e, até mesmo, nas formas com que o trabalho é executado. Essa realidade tem alterado significativamente a relação entre o trabalho operacional e a mão de obra necessária para realizá-lo no tempo.
Outro aspecto importante é a dimensão das estruturas organizacionais. Fica claro que tanto o número de níveis gerenciais, quanto o número de empregados sofrem cotidianamente cortes abruptos. A razão disso é que a função principal de todo esse contingente de pessoas era atuar no suporte de atividades que, simplesmente, seguem desaparecendo.
Por isso, podemos notar a constante e rápida mutação do mercado de trabalho, refletindo nova visão, que exige a revisão de métodos, ferramentas e técnicas, para adequação da força de trabalho. O novo profissional deve estar preparado para vencer desafios e adaptar-se ao rápido ritmo de mudança. Parte da geração de trabalhadores atual, encarregada de implementar avanços tecnológicos cada vez mais radicais, deveria prestar atenção a um problema que diz respeito a gerações anteriores carentes de enxergar nas novas oportunidades tecnológicas a saída sensata para o problema do desemprego estrutural. O certo é que as novas tecnologias demonstram funcionar e fornecem vantagem competitiva estratégica suficiente que justificam o risco de implementá-las.
No caso brasileiro, temos agravantes ocasionadas pelas questões econômicas locais, que afetam diretamente o nível de estabilidade dos empregos e, também, pelo marco regulatório, que remonta práticas do início do século passado, portanto bastante arcaicas. Isto gera insegurança e custos adicionais para toda a estrutura do sistema trabalhista brasileiro.
Por outro lado, o marco regulatório do mercado de capitais brasileiro mostra-se em sintonia com as práticas observadas nos demais mercados internacionais e oferece condições para o surgimento de soluções permanentes, que poderão contribuir significativamente para o crescimento do emprego em nosso país, observada a nova realidade.
É sabido que, no Brasil, setores-chave do ponto de vista do produto, como os setores metalúrgicos, siderúrgico, elétrico, químico e petroquímico não geram muito emprego, e os setores mais importantes do ponto de vista de geração direta e indireta de empregos são vinculados à agroindústria, à indústria da construção civil e ao serviço público em geral.
Neste cenário o Estado brasileiro ainda continua sendo o agente fundamental em todo o processo, coordenando a ação geral, concedendo crédito à produção e ao investimento, promovendo programas de incentivos ao treinamento da mão de obra e implantando a necessária infraestrutura.
O desenvolvimento de projetos-chave pelos agentes de intermediação do mercado de capitais brasileiro pode ser fundamental para gerar economias de escala e desencadear uma série de efeitos induzidos no conjunto da economia. A estratégia de crescimento precisa ser voltada para a produção de manufaturados, com altos coeficientes de trabalho. Com base em experiências internacionais recentes podemos observar que as exportações industrializadas geralmente são intensivas em trabalho, exercendo, portanto, importantes impactos sobre a geração de empregos.
Também, eventuais parcerias no âmbito de um mercado de capitais reconhecidamente maduro, irá viabilizar a implantação de infraestruturas nas diversas regiões do país, bem como projetos que gerem valores para os programas de incentivos às pequenas e médias empresas e possibilite uma descentralização industrial e o estabelecimento de programas de desenvolvimento agrícola. Tudo isso se afigura como uma janela de oportunidades para o mercado de capitais no particular e para a sociedade brasileira no geral, que não pode ser desprezada e que terá fundamental papel na recuperação das atividades econômicas e, por conseguinte, do nível de emprego local.
A estabilização da economia, além de inúmeros benefícios diretos para o país tem, também, o escopo de atrair capitais estrangeiros em volumes crescentes, de sorte que o crescimento econômico tenderá a ser efetuado em função, também, dos investimentos privados. Ao Estado caberá, por seu turno, aumentar sua eficiência e agir preferencialmente na melhoria dos indicadores sociais de desenvolvimento econômico do país.
Quanto maior o grau de estabilidade e previsibilidade do ambiente de negócios no Brasil, maior será a presença do ferramental de mercado de capitais como indutor do desenvolvimento e na geração de emprego e renda, sobretudo por possibilitar melhor mobilização e alocação da poupança interna, redução do custo de capital para os empreendimentos, aumento na disponibilidade de recursos, maior liquidez tanto para empresas como para os investidores, melhoria da taxa de retorno dos empreendimentos, viabilização de maior número de projetos. Isso, por si só, impactaria positivamente a economia proporcionando expansão da produção, com aumento de renda e criação de empregos.
Mas os ganhos intangíveis seriam ainda maiores. A qualidade na gestão dos processos com a natural observância dos princípios de governança possibilita ganhos exponenciais na eficiência de todo sistema econômico e a garantia de adesão à melhoria das questões sociais e ambientais propicia o tão almejado desenvolvimento autossustentável.
Os investimentos em meio ambiente, saúde, segurança, práticas trabalhistas e no desenvolvimento de comunidades locais são importantes vetores de tendência observada no mercado global, ensejando a melhora da reputação das empresas, com excelente desempenho nas dimensões regulatórias e social, com impactos diretos no mercado de trabalho, sobretudo por ajudar as empresas a atrair e reter empregados de alta qualidade, tornando os processos de recursos humanos mais eficazes e eficientes. Além disso, a redução de acidentes ambientais e a melhoria da segurança e saúde dos empregados aumentam a produtividade e reduzem custos operacionais. Podemos comprovar no mercado de capitais que as empresas com reputação notável nesses segmentos, geralmente desfrutam de ótima imagem perante os clientes e os investidores socialmente conscientes.
Finalmente, vale destacar que países como o Brasil foram dotados de grande base de recursos naturais, mas investiram mal em pessoas e sistemas. Em consequência, a sua produtividade per capita é mais baixa e desfruta de taxa de crescimento muito mais reduzida do que países que possuem poucos recursos naturais, mas investem intensamente em capital humano e em capital da informação, assim como em processos eficazes. No nível macroeconômico e microeconômico, não temos dúvida em afirmar que os ativos intangíveis podem impulsionar a criação de valor a longo prazo e favorecer toda a economia brasileira, conforme o esquema abaixo apresentado:
Todas essas conexões procuram ilustrar como a gestão eficaz do desempenho regulatório e social é capaz de impulsionar, no longo prazo, a criação de valor para economia brasileira. Fica claro também que os fenômenos provocados pelas novas tecnologias impactaram diretamente o mercado de trabalho global e não só o brasileiro. Portanto, o mais significativo é que temos um mercado de capitais que está pronto para vencer desafios e profissionalmente preparado para contribuir para o fortalecimento da economia brasileira.
César Augusto Moreira Bergo, é Presidente do CORECON-DF. Economista, sociólogo e mestre em finanças e especialista em administração estratégica e governança corporativa pela FIA/USP. Professor de pós-graduação universitária e de diversos cursos no mercado financeiro. Atua há mais de 40 anos no mercado financeiro tendo exercido cargos de executivo em bancos, corretoras e distribuidoras de valores, além de possuir diversas certificações para atuar no mercado financeiro.