MARIO CEZAR SILVA SERPA
Corecon-DF nº 6530.
Não é de todo absurdo comparar a CPI da Covid a um jogo. Afinal, não são poucos os que pensam que os objetivos mais nobres do Colegiado estão em segundo plano, e o que importa mesmo é a politização. Neste sentido, resta-nos saber se a CPI será um jogo cooperativo ou não-cooperativo, segundo interesses dos “jogadores” (de um lado o governo e seus aliados e do outro os demais membros, majoritários, da CPI). Os economistas têm nos ajudado bastante nessa seara com a Teoria dos Jogos, uma estrutura para modelar cenários nos quais existem conflitos de interesse entre os jogadores, que tentam prever suas decisões em uma sequência de ações e reações.
Escolhas racionais parecerem direcionar nossas atitudes para que os resultados sejam sempre em nossos melhores benefícios. O matemático John Nash propôs o que se conhece como Nash Equilibrium em um jogo competitivo onde nenhum jogador tem incentivo para alterar sua estratégia após avaliar a escolha do oponente. Por outro lado, em um jogo cooperativo, a solução do problema envolve uma distribuição (em regra não equitativa) justa de perdas e ganhos dos jogadores envolvidos, isto é, na visão do economista Lloyd Shapley, uma coalisão. Dessa cooperação extrai-se o conceito Shapley Value, onde cada jogador ganhará mais do que se estivesse agindo isoladamente. Assim, para o primeiro caso, a Teoria dos Jogos nos apresenta como sermos inteligentes e, para o segundo, como sermos justos.
A CPI da Covid foi instalada dia 27 ABR e mesmo antes disso o governo estruturou equipe para enfrentá-la e, curiosamente “vazou” um documento com os principais pontos de possíveis ataques ao governo. Este ato tem levado situação e oposição a críticas, em maior ou menor contundência a respeito, mas sempre no mesmo sentido, variando de uma atitude “amadora” até “tiro no pé”, respectivamente. Talvez não seja bem isso e exista uma outra avaliação. A hipótese de que o governo saiba muito bem o que fez (fatos são abundantes) e isto possa deixá-lo em apuros, pode sugerir que não se deseje um jogo competitivo, muito pelo contrário. Mas, como fazer isso com tantos holofotes e acirramento político? Sutilmente e subconscientemente, induz-se, aos poucos e constantemente, ao que se deseja orientar como adequado e justo na investigação. Seria subjugar a inteligência da oposição? Não, somente um processo de convencimento que existem benefícios mútuos, e que jogos relevantes na vida real envolvem jogadas sucessivas, incluindo algumas aparentemente contraintuitivas.
Diz-se que todos sabem como uma CPI começa, mas não como termina. Nesta parece claro que uma das vertentes pode ser o caminho do impeachment do Presidente. O Comandante-em-Chefe certamente não deseja isso, mas a oposição, notadamente o PT, parece também não! Contudo, a CPI pode “sair do controle” e o resultado ser invariavelmente este – ruim para todos. O impeachment do Presidente traz imediatamente o Vice-Presidente para a condução do País, e este é mais do que uma incógnita, ele pode ser a terceira via ou o caminho para ela, e atrapalhar os planos para a oposição em 2022. Melhor seria mesmo deixar o atual Mandatário “sangrando” até lá, e derrotá-lo acachapantemente. Por outro lado, em um jogo cooperativo, o governo ganha tempo e com isso fôlego para alguma reação.
Desta forma, neste jogo parece que o governo não deve entrar mesmo na tentativa de estabelecer um Nash Equilibrium (desconsidere as aparências, ataques e espetacularizações iniciais), mas verdadeiramente encontrar um Shapley Value. Neste caso, seria inteligente e justo, mas o preço do Centrão subiria e muito. Entretanto, não é fácil admitir a existência dessas duas qualidades na equipe encarregada de conduzir o processo da CPI da Covid no governo. Talvez a divulgação da lista dos 23 tópicos tenha sido pura e simplesmente uma burrice extrema mesmo. Só isso, nem mais nem menos. Nesta linha de raciocínio e daqueles que não desejam a polarização do atual governo e a possível volta da esquerda no comando do País, a torcida recai para que cada jogador, com sua empáfia e arrogância, continue a jogar de forma independente e austera.
Que ambas as partes prossigam na tentativa de se obter o melhor resultado para si. O Brasil agradece.
Mario Serpa é economista e sócio da Redwood Asset Management.
“Os conteúdos dos textos publicados, artigos e notas, além dos comentários do público, são de responsabilidade exclusiva de seus autores e signatários, não envolvendo ou refletindo posicionamentos ou opiniões do CORECON-DF.”