Mario Cezar Silva Serpa
Corecon-DF nº 6530.
Parece sempre uma boa atitude termos disposição e encararmos nossos problemas com altivez e otimismo – ver o copo meio-cheio é um estado de espírito, que nos coloca em posição “vencedora” na largada. A realidade, entretanto, as vezes nos freia o ímpeto, e serve como anteparo e reforça cautelas, ao tempo em que reavaliamos os riscos. A tríplice crise que vivemos nos faz agir assim: com o destemor e o descaso à vicissitude dos eternos otimistas, mas também com a crueza e as agruras que o momento nos avassala e suscita extrema prudência e atenção aos fatos.
O desafio que se impõe ao Brasil é, sem dúvidas, um teste à nossa resiliência e uma prova à nossa maturidade como democracia e nação que deseja ser desenvolvida. Um verdadeiro divisor de águas. Do lado político e institucional, precisamos controlar excessos dos poderes, e encontrar harmonia no aparente caos. Não por menos, a sociedade brasileira votou em um Presidente para ser disruptivo em tudo que estávamos vivendo até então. Só não contávamos que haveria um Covid-19 no meio do caminho, e para tanto seriam necessárias outras características e atitudes de nosso Mandatário.
Esses reveses da vida, acometidos nos quatro cantos do planeta, têm poder de nos atrasar e reverter nossa recente tendência de realinhamento econômico. Contudo, com um mínimo de atinência política de nosso Presidente às promessas no campo econômico, poderemos, ainda que de forma mais custosa, lograr êxito na superação destes obstáculos. A política, e sobretudo como esta é conduzida e influenciada, depende em grande parte da postura e diretrizes do Comandante em Chefe. Suas ações e conduta são o guia da sociedade para a transformação tão desejada.
Nesta linha a pandemia também é um fator crucial, notadamente porque o Presidente não se alinha ao que diz a ciência, se vitimiza em relação às decisões do STF a este assunto e atrapalha com ruídos e desatinos. Crises em regra são associadas a oportunidades e este poderia ter sido um momento ímpar para evolução política e liderança. Um evento perfeito para unir o país, superando as dificuldades próprias do surto e sobretudo endereçando pautas importantíssimas para o Brasil. De forma oposta, assistimos ao Coronavírus tomar todas as atenções e estabelecer o caos autonomamente, alimentando ainda mais a desarticulação política e contaminando várias pastas.
A sociedade brasileira mandou um recado muito claro com a eleição de Bolsonaro e a renovação do Congresso Nacional (CN): desejavam-se mudanças radicais. Os movimentos das ruas e o tensionamento máximo levaram os brasileiros a sinalizar, nas urnas, o rompimento com o status quo, de forma que pudéssemos ter reformas amplas, gerais e irrestritas. Não é o que temos visto, muito pelo contrário. O primeiro ano de governo, tido como aquele que se apresenta e mostra verdadeiramente a que veio – com aval e aprovações quase uníssonas de todos os segmentos da sociedade – passou e avançamos essencialmente na Reforma Previdenciária. Uma pena, pois timing é tudo e precisávamos de muito mais.
Neste sentido, é necessário resgatar o que restam de chances, ainda que remotas. É fundamental não errarmos mais, ao menos não tão desgraçadamente. O apoio irrestrito ao Ministro Paulo Guedes e o retorno a sua agenda liberal é, neste momento, nossa única saída. Em outras palavras, abandonar a paralisia das reformas e estruturarmos forças-tarefas múltiplas enquanto permanece ainda algum rasgo de reformismo no CN. Sim, a velha política que restou da recomposição de nossos legisladores, que Bolsonaro agora se alia, não guarda bom histórico com reformas, e tem poder de se fazer “impor” ainda que sendo minoria, renascendo como um fênix e aproveitando-se das fragilidades do momento. É uma situação binária que vivemos, e o brasileiro está cansado. Essa, uma vulnerabilidade enorme, que abre espaço para oportunismos e desvios de rota. Infelizmente, as portas se fecham rapidamente, não podemos vacilar.
Assim, política, pandemia e reformas não realizadas, atuam neste momento conjuntamente em desfavor da retomada econômica. Contudo, com um mínimo de liderança e competência a “vontade política” volta. Aproveitando o binômio juros-inflação baixo “meritosamente” conquistado e a posição relativa ainda razoavelmente favorável ao Brasil frente a seus pares no exterior, vários indicadores podem, com algum esforço, melhorar significativamente. A agenda do BACEN é excelente, a manutenção do Teto dos Gastos tem sido uma vitória e a visão fiscalista do time econômico um diferencial importante.
Nesta linha, um “indicador” serve como termômetro de tudo que acontece: a cotação do Dólar. O quadro da página anterior estabelece a “dimensão” e impactos de alguns fatores. A decomposição hipotética apresentada aponta como influenciam. Controlar o nível e a volatilidade do Dólar (seja por identificação de disfuncionalidades ou não) é, ao mesmo tempo, um “esporte” predileto de alguns e uma anomalia total para quem acredita no livre mercado. As forças de mercado, de um jeito ou de outro, no longo prazo e com a economia minimamente aberta, cuidam disso tudo.
Entretanto, isso não significa que não existam fricções, que alguns fatores não sejam persistentes e que desvios em relação ao preço “justo” não se sustentem por um bom período. O gráfico acima não deixa dúvidas dessa afirmativa. Contudo, raras vezes a cotação esteve tão “deslocada” como agora e sugere reversão. Será? Lembre-se de nossa situação binária! Eis que o “rei Dólar” (nível, vol., fluxo) continuará sendo um excelente indicador de nossa saúde (economia real) e interesse de investidores. Com fundamentos mais sólidos e um BP forte, basta o BACEN não querer “ajudar” no câmbio e teremos o equilíbrio dinâmico.
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Interessante o artigo.