Rogério Nagamine Costanzi
Os impactos do envelhecimento populacional são amplos e diversos. Embora seja reflexo do positivo incremento da expectativa de vida, demanda planejamento de médio e longo prazo das políticas públicas, algo que não tende a ser prioridade no cenário político, em geral, mais focado em interesses eleitorais de curto prazo.
O envelhecimento tende a gerar pressões nos gastos com previdência, saúde e assistência, ou seja, para o sistema de Seguridade Social como um todo. Também cria demandas legítimas por políticas de cuidados de longa duração.
Um aspecto que também deveria ser analisado é o fato das tendências demográficas estarem alterando, de forma significativa, a estrutura etária da força de trabalho no mundo e no Brasil. Essa alteração certamente tem implicações para as políticas públicas, por exemplo, de (re)qualificação dos trabalhadores. O ritmo crescente da mudança tecnológica já demandaria, por si só, maior necessidade da aprendizagem ao longo da vida. O envelhecimento da estrutura etária da força de trabalho reforça ainda mais essa necessidade. O chamado lifelong learning é fundamental para que os indivíduos se adaptem e tenham sucesso em mercados de trabalho e sociedades moldadas por mudanças demográficas, maior expectativa de vida, rápidos avanços tecnológicos e globalização (OECD, 2021).
Para avaliar, de forma breve, essa questão, o presente artigo está organizado da seguinte forma:
- a) na primeira seção é feita uma análise sintética da evolução da estrutura etária da força de trabalho brasileira elaborados a partir dos microdados da PNAD Contínua no quarto trimestre de 2012 e no mesmo período de 2022;
- b) na segunda seção é feita uma simulação da evolução esperada a partir da projeção demográfica para o ano de 2060;
- c) na terceira parte são feitas as considerações finais.
1 – Evolução da Estrutura Etária da Força de Trabalho Brasileira entre o quarto trimestre de 2012 e o mesmo período de 2022
Em que pese as peculiaridades do período de 2012 a 2022, com fraco desempenho da economia brasileira, com forte recessão nos anos de 2015/2016, pandemia de COVID e a consequente não realização do Censo em 2020, estimativas, elaboradas a partir dos microdados da PNAD Contínua do quarto trimestre de 2012 e no mesmo período de 2022, apontam para o envelhecimento da força de trabalho e da população ocupada no referido período (gráfico 1 e tabela 1).
Entre o quarto trimestre de 2012 e o mesmo período de 2022, houve incremento das idades média, mediana e dos percentis tanto para a força de trabalho, como para ocupados e desocupados (tabela 1). A idade média da força de trabalho subiu de 36,9 para 38,8 anos, enquanto a mediana, na mesma comparação, se elevou de 35 para 38 anos.
O incremento da idade média e mediana da força de trabalho e dos ocupados reflete tanto a mudança da estrutura etária da população, como também, outras razões além das demográficas, como alterações do próprio mercado de trabalho, que também devem atuar para a continuidade deste processo nas próximas décadas. A tendência de entrada no mercado de trabalho mais tardia por parte dos mais jovens e a maior participação daqueles com 50 anos ou mais por conta, entre outros fatores, da reforma da previdência, devem a elevar a taxa de participação das faixas etárias com mais de 50 anos e reduzir entre aqueles na faixa de 16 a 19 anos. Também houve incremento das idades média e mediana dos trabalhadores ocupados e desocupados (vide tabela 1).
Entre o quarto trimestre de 2012 e o mesmo período de 2022 houve retração da força de trabalho na faixa etária de 16 a 29 anos, enquanto houve incremento nas faixas de 30 a 39 anos, 40 a 49 anos, 50 a 59 anos e 60 anos ou mais de idade, mas mais intenso para aqueles com 40 anos ou mais de idade. A participação dos trabalhadores com 50 anos ou mais de idade na força de trabalho (considerando aqueles de 16 anos ou mais) cresceu de 18,6% para 22,4% do total entre o quarto trimestre de 2012 e o mesmo período de 2022. Já a participação dos trabalhadores de 40 anos ou mais de idade (considerado aqueles com 16 anos ou mais), cresceu, na mesma comparação, de 39,5% para 45,1%.
Gráfico 1 – Força de Trabalho no Brasil segundo idade (16 anos ou mais) quarto trimestre de 2012 e quarto trimestre de 2022
Fonte: elaboração a partir dos microdados da PNAD Contínua do quarto trimestre de 2012 e quarto trimestre de 2012.
Tabela 1 – Idade Média e Mediana da Força de Trabalho, Ocupados e Desocupados – Brasil – quarto trimestre de 2012 e quarto trimestre de 2022
Média, Mediana e Percentis | Força de Trabalho | Ocupados | Desocupados | |||
2012 | 2022 | 2012 | 2022 | 2012 | 2022 | |
Média | 36,9 | 38,8 | 37,5 | 39,3 | 29,6 | 32,6 |
25 | 26 | 28 | 27 | 29 | 21 | 22 |
Mediana | 35 | 38 | 36 | 38 | 27 | 29 |
75 | 46 | 48 | 47 | 49 | 36 | 42 |
90 | 55 | 57 | 55 | 58 | 47 | 52 |
Fonte: Elaboração a partir dos microdados da PNAD Contínua do quarto trimestre de 2012 e quarto trimestre de 2012.
2 – Projeção da Estrutura Etária da Força de Trabalho Brasileira
Um exercício mais atrativo consiste em projetar a estrutura demográfica da força de trabalho nas próximas décadas e estimar a tendência da idade média e mediana. Utilizando a última projeção demográfica do IBGE, de 2018, é possível projetar a força de trabalho para o ano de 2060.
Embora seja provável esperar mudanças nas taxas de participação por idade individualizada, em especial, um possível aumento para faixa de 50 anos ou mais, é muito difícil, contudo, projetar essas referidas taxas para 2060. Por essa razão, por simplificação, será feita a estimativa considerando as taxas de participação prevalecentes no quarto trimestre de 2022. Essa simplificação pode resultar, na realidade, em subestimativa da evolução das idades médias e medianas para 2060. De qualquer forma, serve como uma estimativa que deve captar as tendências de longo prazo para as referidas variáveis.
Feitas estas ressalvas, a projeção da força de trabalho para o ano de 2060 será estimada a partir da projeção da população por idade individual em 2060, do IBGE, multiplicada pelas taxas de participação estimadas pelos microdados da PNAD Contínua no quarto trimestre de 2022, segundo a seguinte fórmula:
O somatório da força de trabalho para cada idade individualizada permite uma estimativa para a população economicamente ativa no ano de 2060[1]. Usando essa metodologia, se pode notar que há retração da força de trabalho de 6,3% entre 2022 e 2060. Essa retração mostra a necessidade, visando melhores resultados do ponto de vista de crescimento econômico, de políticas que busquem incrementar a taxa de participação como também a necessidade urgente de ações visando o aumento da produtividade do trabalho. Há maior potencial de incremento das taxas de participação entre as mulheres do que entre pessoas do sexo masculino. Também é fundamental o incremento da taxa de participação na faixa de 50 a 64 anos tendo em vista que, entre 2022 e 2060, o incremento da população deverá ocorrer para o grupo etário de 49 anos ou mais de idade[2].
Além da retração da força de trabalho, haveria também um processo de envelhecimento da população economicamente ativa. A idade média da força de trabalho aumentaria de 38,8 anos, em 2022, para 42,1 anos no ano de 2060. Ademais, a mediana subiria de 38 para 41 anos na mesma comparação (tabela 2).
Gráfico 2 – Força de Trabalho no Brasil segundo idade (16 anos ou mais) quarto trimestre de 2022 e projeção para 2060
Fonte: elaboração a partir dos microdados da PNAD Contínua e projeção da população do IBGE
Tabela 2 – Idade média, mediana e participação de 40 anos e 50 anos ou mais na força de trabalho Brasil quarto trimestre de 2022 e projeção para 2060
Idade Média, Mediana e participação na força de trabalho total | Quarto trimestre de 2022 | Projeção 2060 |
Idade Média | 38,8 anos | 42,1 anos |
Idade Mediana | 38 anos | 41 anos |
Participação de 40 anos ou mais na força de trabalho* | 45,1% | 54,4% |
Participação de 50 anos ou mais na força de trabalho* | 22,4% | 32% |
Fonte: elaboração a partir dos microdados da PNAD Contínua e projeção da população do IBGE. * Considerando pessoas com 16 anos ou mais de idade.
Outro resultado a ser destacado é que a participação dos trabalhadores com 40/50 anos ou mais de idade na força de trabalho tendem a continuar crescendo nas próximas décadas. A participação das pessoas com 40 anos ou mais deve subir de 45,1% para 54,4% do total entre o quarto trimestre de 2022 e o ano de 2060.
Comportamento semelhante se espera para aqueles com 50 anos ou mais de idade: a participação na força de trabalho deve se elevar de 22,4% para cerca de 32% na mesma comparação, ou seja, de um patamar próximo de ¼ para cerca de 1/3. Essa maior importância relativa das pessoas com 40 anos ou mais de idade reforça a necessidade do chamado lifelong learning, sendo ainda mais essencial tendo em vista a atual conjuntura de alta velocidades dos avanços tecnológicos.
3 – Considerações Finais
Este artigo analisou o envelhecimento da estrutura etária da força de trabalho, pela combinação da demografia, mudanças no mercado de trabalho e possível elevação da taxa de participação na faixa de 50 a 64 anos devido a reforma da previdência.
Em função da combinação desses fatores, as idades médias e mediana, que cresceram entre 2012 e 2022, devem continuar crescendo nas próximas décadas. A estimativa, a partir dos microdados da PNAD Contínua, é que a idade média da força de trabalho subiu de 36,9 para 38,8 anos entre o quarto trimestre de 2012 e o mesmo período de 2022, enquanto a mediana, na mesma comparação, se elevou de 35 para 38 anos. Fazendo a projeção para 2060, a idade média aumentaria de 38,8 anos, em 2022, para 42,1 anos em 2060. Ademais, a mediana subiria de 38 para 41 anos na mesma comparação.
A participação das pessoas com 40 anos ou mais deve subir de 45,1% para 54,4% do total entre o quarto trimestre de 2022 e o ano de 2060 e, para aqueles com 50 anos ou mais de idade, deve se elevar de 22,4% para cerca de 32% na mesma comparação.
Também, mantida as taxas de participação por idade de 2022, haveria retração da força de trabalho de 6,3% entre 2022 e 2060. Em função dessas tendências é fundamental adoção de políticas que busquem incrementar a produtividade do trabalho, a taxa de participação e políticas de lifelong learning para atenuar os esperados impactos negativos da demografia sobre o crescimento econômico.
O lifelong learning é fundamental para enfrentar mercados de trabalho afetados por mudanças demográficas, maior expectativa de vida rápidos e intensos avanços tecnológicos e globalização (OCDE, 2021). A ideia de que a aprendizagem pertence apenas aos jovens é desatualizado e não atende às demandas de sociedades e mercados de trabalho em constante mudança.
Do ponto de vista ideal, a aprendizagem deve começar na infância e juventude, mas deve continuar durante toda a vida adulta. Entretanto, na prática, não é trivial estabelecer a aprendizagem ao longo de toda vida, dada a inerente natureza heterogênea dos aprendizes e da aprendizagem, que pode ocorrer em ambientes formais, não formais e informais, envolvendo indivíduos de idades diversas e mesmo mais avançada, com diferentes interesses em se engajar em atividades de (re)qualificação.
Referências bibliográficas
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. PESQUISA NACIONAL POR AMOSTRA DE DOMICÍLIOS CONTÍNUA – PNAD CONTÍNUA – Quarto Trimestre de 2022 e Quarto Trimestre de 2012.
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da População de 2018.
ILO – International Labour Office. Ageing of the Labour Force in OECD Countries: Economic and Social Consequences. Peter Auer e Mariàngels Fortuny.
OECD (2021), OECD Skills Outlook 2021: Learning for Life, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/0ae365b4-en .
OECD. WORK FORCE AGEING: CONSEQUENCES AND POLICY RESPONSES. WORKING PAPER
APÊNDICE
Gráfico 1
Fonte: elaboração a partir de microdados da PNAD Contínua e projeção da população do IBGE de 2060
Gráfico 2
Fonte: elaboração a partir de microdados da PNAD Contínua e projeção da população do IBGE de 2060
Gráfico 3
Fonte: elaboração a partir de microdados da PNAD Contínua e projeção da população do IBGE de 2060
Gráfico 4
Fonte: elaboração a partir de microdados da PNAD Contínua e projeção da população do IBGE de 2060
[1] A projeção foi feita para a faixa etária de 16 a 89 anos e para a população de 90 anos ou mais de idade. A projeção para a idade de 90 anos ou mais foi feita com a taxa de participação dessa mesma faixa etária.
[2] Considerando a projeção demográfica do IBGE de 2018, que deverá ser revisada após o Censo de 2022 e comparando a projeção de 2023 com a do ano de 2060.
Rogério Nagamine Costanzi é Doutor em Economia pela Universidade Autônoma de Madrid. Mestre em Economia pelo IPE/USP e em Direção e Gestão de Sistemas de Seguridade Social pela Universidade de Alcalá/Espanha e pela Organização Ibero-americana de Seguridade Social (OISS). Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Governo Federal. O autor teve passagens pelo Ministério da Previdência Social (Assessor Especial do Ministro, Diretor do Departamento e Subsecretário do Regime Geral de Previdência Social e Coordenador-Geral de Estudos Previdenciários), Ministério do Trabalho e Emprego (Assessor Especial do Ministro e Coordenador-Geral de Emprego e Renda), Ministério do Desenvolvimento Social, IPEA (Coordenador de Seguridade Social) e OIT. Foi membro do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS), do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT), do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI) e do Conselho Nacional do Trabalho (CNT). Ganhador do Prêmio Interamericano de Proteção Social (2° lugar) da Conferência Interamericana de Seguridade Social (CISS) em 2015 e do Prêmio SOF de Monografia (2º lugar) do Ministério do Planejamento/ESAF em 2016. Foi Presidente do Cone Sul da Conferência Interamericana de Seguridade Social (CISS) e Vice-Presidente da Comissão de Adultos Mayores da Conferência Interamericana de Seguridade Social (CISS). (E-mail: rogerio.costanzi@uol.com.br).
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