Conselho Regional de Economia do Distrito Federal – Corecon-DF
Grupo de Conjuntura Econômica – relatório da Reunião nº 06/2013, realizada em 27/07/2013
Tema: A política econômica brasileira no novo cenário externo e diante da nova conjuntura política e social
Esse encontro foi continuação do de 29 de junho, em que se discutiu “As manifestações e a economia”. O propósito era verificar se o governo federal, após os protestos de rua, teria adotado uma nova postura no campo da política econômica, e avaliar as perspectivas à frente, a partir do ponto em que se acumularam as críticas dos analistas, o grau do país foi rebaixado e a Presidente (e, com maior ou menor intensidade, os demais políticos) viu sua popularidade despencar. Em que medida por trás do ambiente negativo construído em torno das vicissitudes políticas da Presidente e da divulgação das diversas razões para a insatisfação dos investidores estaria a determinação de rever os rumos da política econômica?
Como pano de fundo, persistem as incertezas quanto ao cenário internacional, onde toda novidade é má notícia. Estatísticas sobre a economia dos EUA oscilam a cada trimestre. Dados do Fundo Monetário Internacional, em sua publicação World Economic Outlook, comparando previsões de crescimento em 2013 de abril para de sua atualização de julho, mostram queda para todos os principais países, à exceção do Japão, e principais grupos de países. No caso do Japão, participantes da reunião duvidaram que a nova estimativa de 2% se possa realizar.
A agência Standard and Poor’s viu risco acentuado no expansionismo da política fiscal brasileira e reavaliou para pior os fundamentos da economia brasileira, corroborando sinais de aversão ao risco Brasil. A rápida desvalorização do real foi consequência da perspectiva de interrupção, próxima, dos estímulos monetários promovidos pelo Federal Reserve Bank para a reativação da demanda interna. Essa perspectiva já se refletiu nos juros norte-americanos e aponta para altas subsequentes.
Esse ambiente externo, lembraram alguns presentes, foi retratado na “The Economist” mais recente (27 de julho), em que o artigo “A grande desaceleração” afirma, para além das dificuldades europeias e norte-americana, que a perda do ritmo de crescimento dos mercados emergentes certamente é um ponto de inflexão da economia mundial. Na visão do Grupo de Conjuntura, o novo modelo de crescimento chinês, movido pelo consumo das famílias, antes pelas exportações e investimento, pode não garantir o esperado avanço do PIB ao ritmo de 7,5% que o governo persegue. Análises da conjuntura alertam com cada vez mais frequência para o risco de uma iminente crise do crédito (credit crunch) naquele país, que poderia baixar que essa nova estimativa se possa realizar o crescimento potencial a até 4%.
Os debates foram reencaminhados para nossas questões internas pela instigante proposição de que nossa Presidente poderia estar sendo vítima de uma ampla conspiração, com ramificações internacionais, voltada para desacreditar os governos de esquerda no continente. O Grupo ficou dividido sobre o assunto. Participantes atribuíram a intensidade das críticas à antecipação do calendário eleitoral, para muitos um erro político; outros, à pretensão despropositada das autoridades.
Ao mesmo tempo, observaram alguns, não haveria partido no Brasil capaz de se beneficiar de uma orquestração dessa natureza, pois nenhum deles defende políticas ditas de direita. Foi salientado que na reunião anterior o Grupo de início declarou-se surpreendido com a expressividade das manifestações, já que todos os indicadores econômicos e sociais ainda eram bons, mesmo que aos olhos de analistas mais experimentados mostrassem sinais de deterioração. A grande maioria dos presentes reconheceu que a economia não está em situação calamitosa, mas a confiança no piloto está arranhada. Abusou-se no passado recente de intervenções pontuais como instrumento de estímulo, sem retorno em termos de crescimento econômico, de vendas, nem do emprego e da renda.
Economistas presentes lembraram outras coincidências que favoreceram o bom desempenho da economia em passado recente. Para além da evolução dos termos de troca, o Brasil conseguiu tirar proveito, ainda que modestamente, do bônus demográfico que consistiu em contingente proporcionalmente elevado de indivíduos em idade economicamente ativa, e da profundidade da crise alheia, que reorientou os fluxos de investimentos para os países emergentes, dentre os quais o Brasil se destacava. Quanto ao momento atual, tendo sido deixadas por fazer reformas fundamentais, a capacidade de resposta do governo está limitada pelo grau de globalização da economia e pela rigidez da sociedade e das instituições nacionais. O crescimento está morno em todo o planeta, e estudos indicam que a recuperação da indústria norte-americana se apoiará mais que nunca na robótica, desvalorizando a mão de obra e tornando a retomada global mais concentradora de renda.
Alguns concordaram que a sociedade brasileira é refratária a mudanças e inibe as reformas. É o caso da MP dos Portos, que previa substancial modernização do setor, profundamente alterada no Congresso e sob risco de ter os vetos presidenciais à lei de conversão derrubados. É também o caso da reforma da Previdência, que grupos organizados buscam em parte reverter.
Foi citado estudo que sugere que apenas ¼ do crescimento brasileiro se deveu ao aumento da produtividade, e que o resto veio da melhora das relações de troca com o exterior, valorizando o real, reduzindo a parcela da renda comprometida com o consumo dos tradables, dando espaço para a demanda por serviços e ampliando notavelmente as oportunidades de emprego. Os prognósticos são ruins, por conta do fim do superciclo das commodities e do que mais está no horizonte: pessimismo em relação à economia chinesa, desvalorização do real e empobrecimento, adiante, de amplas camadas da população. O retrospecto das iniciativas dos governos recentes não é animador, pois ficou claro que faltou planejamento, e a depender dessa equipe continuará faltando em tempos difíceis. Em reunião anterior do Grupo falou-se abundantemente da falta de uma política industrial para o país.
Participantes sublinharam erros relativamente recentes que fizeram com que os mercados de capitais perdessem a importância como instrumento de financiamento das empresas que haviam conquistado. Ilustrativo é o caso das cotações das ações da Petrobras na bolsa de valores, que despencaram ao longo destes últimos anos por conta do ativismo incontido do governo no setor e de sua interferência na administração da empresa. Mesmo diante da necessidade de aumentar suas importações e com o dólar em alta, praticamente congelou-se o preço da gasolina para ajudar a conter a inflação, o que de quebra prejudicou o mercado para o etanol. Devemos o desequilíbrio crescente da balança do petróleo em grande parte aos diversos mecanismos por algum tempo bem sucedidos de estímulo ao endividamento e ao consumo, que fez crescer a passos largos a frota de veículos: crédito farto, juros em queda, desonerações de tributos indiretos, redução do imposto sobre operações financeiras. De outro lado, os bancos se defrontam agora com a inadimplência em crescimento. A propósito, foi trazido ao conhecimento do Grupo reportagem de jornal que assinalava o grau preocupante de endividamento do servidor público em Brasília e a notícia de que o Banco do Brasil voltou a aumentar a taxa de juros de seus clientes.
Foi notado que o Brasil tem dificuldade em dar o salto necessário no campo da educação e da saúde, serviços públicos mais requisitados pelas classes C e D. Um participante, conhecedor da cooperação internacional nessas áreas, destacou que a universalização do ensino fundamental foi alcançada ainda na gestão de FHC, mas falta qualidade, e que as organizações externas que se propõem a financiar inovações não conseguem penetrar as barreiras institucionais existentes. Algo parecido se dá na saúde, segundo sua opinião: melhorar não se resume a prestar bom atendimento ao público, mas também estimular hábitos saudáveis de vida, noção ainda pouco valorizada pelos gestores.
Participantes do Grupo, contrabalançando o teor crítico dos comentários de até então, lembraram que a demanda por bens públicos cresce com a renda, e que o governo faz o que pode com seu orçamento. Um dos presentes lembrou que por ocasião da implementação do programa de construção de aeroportos do fim da década de 1990 a avaliação era de que havia excesso de oferta, e hoje nos defrontamos com estrangulamentos nos principais terminais do país.
Na segunda etapa dos debates, a pergunta inicial que se colocou foi se teria havido, como anunciado, movimento de retorno ao tripé da política econômica (câmbio flexível, sistema de metas de inflação e superávit primário nas contas públicas)? O Copom estaria determinado a endurecer e a perseguir a convergência da inflação em direção (ao centro d) à meta a partir do segundo semestre de 2013, como afirmou o presidente do Banco Central? Estaríamos convencidos de que houve cortes suficientes no orçamento e de que as contas públicas estariam mais transparentes?
Para alguns o Banco Central reassumiu sua independência e quer controlar os preços. Sintoma disso foi que, mesmo com a perspectiva de deflação em julho, o Copom decidiu pelo aumento da Selic para 8,5%. Para outros, se de um lado não há espaço para descumprimento da meta de inflação, como nos primórdios do sistema de metas, de outro o que se persegue não é o centro, e sim o limite superior da meta.
Participantes opinaram que os juros no Brasil são muito altos e mudança recente na política monetária destoa do que pratica o resto do mundo. A tarefa de conter a demanda agregada deveria ser entregue à política fiscal, e o uso desproporcional dos juros como instrumento anti-inflacionário em ambiente fiscalmente expansionista não só não segura preços, como abafa a atividade econômica.
Do lado da política fiscal, as esperanças pareceram remotas. O conteúdo do “pacto” pela responsabilidade fiscal ainda é uma incógnita. O comportamento da receita tributária continua ruim em todas as esferas de governo, malgrado o fim das desonerações, e não há indícios de alteração desse quadro.
A promessa de obtenção de superávit primário da ordem de 2,3% do PIB, um dos poucos elementos conhecidos desse pacto, deve ser tomada com muita reserva, porque os dados mostram resultados acumulados em 12 meses bastante inferiores a isso, e o desempenho das contas públicas neste exercício vem mostrando piora em relação a 2012, ano em que o resultado primário, descontada a receita do resgate de cotas do Fundo Soberano do Brasil, ficou em 1,65% do PIB.
De resto, as receitas constantes da programação orçamentária federal de 2013 estão claramente superestimadas. Não há também muito onde cortar do lado das despesas, e o ônus do ajuste recairá sobre os investimentos públicos, já insuficientes, se o programa fiscal for levado a ferro e fogo.
Sobre transparência, os artifícios contábeis continuam sendo usados para produzir receitas, inclusive mediante antecipação de ingressos futuros, e descaracterizar despesas primárias. O caso do leilão de Libra é exemplo do ônus que deriva da indisciplina orçamentária, porque ao cobrar em edital bônus de assinatura mínimo de R$ 15 bilhões, as ofertas de participação da União nas receitas futuras do petróleo tendem a ser menores.
Lista dos participantes:
- Augusto Hiromu Emori
- Carlos Eduardo de Freitas
- Hélio Socolik
- José Eustáquio de Carvalho
- José Fernando Cosentino Tavares
- José Luiz Pagnussat
- Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo
- Mônica Beraldo Fabrício da Silva
- Túlio E. Marques
- Victor José Hohl