Uma das prioridades do plano de trabalho do Conselho Federal de Economia (Cofecon) para 2021 são as ações para impedir a aprovação da PEC 108/2019 no Congresso Nacional. O Cofecon tem se mobilizado junto aos demais conselhos profissionais e à Frente Parlamentar de Apoio aos Conselhos Profissionais nessa empreitada. A proposta atualmente está em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados.
A PEC, elaborada pelo Ministério da Economia do Governo Bolsonaro, visa alterar a natureza jurídica dos conselhos profissionais, transformando-os em pessoas jurídicas de direito privado. “A visão de desregulamentação do atual governo é explícita, muito centrada no ultraneoliberalismo e na visão equivocada do “Estado mínimo”, tão nociva à sociedade. A tentativa de desregulamentação dos conselhos profissionais faz parte dessa lógica tacanha”, afirma o presidente do Cofecon, Antonio Corrêa de Lacerda.
Para o conselheiro federal e ex-presidente, atual coordenador da Comissão de Normas do Cofecon Paulo Dantas da Costa, representante do Cofecon em reunião realizada em 1º de junho, “O projeto traz transformações significativas na natureza dos conselhos profissionais, que sempre exerceram uma atividade essencialmente de Estado. Isso tem causado uma total rejeição por parte de representantes das 32 profissões regulamentadas”.
Na prática, a proposta representa a inviabilização do trabalho de fiscalização e regulamentação profissional no país. A atividade de fiscalização prima pela qualidade, legalidade e adequação dos bens produzidos e dos serviços realizados em solo brasileiro. Assim sendo, trata-se de uma atividade imprescindível para a garantia da segurança do cidadão e para a busca da satisfação da sociedade em seus mais diversos setores.
Por seu caráter essencial ao atendimento das demandas sociais com segurança e legalidade, o exercício da atividade de fiscalização requer, indispensavelmente, legitimidade, isonomia e transparência, características intrínsecas à Administração Pública. Portanto, o Cofecon entende que não faz sentido o argumento de que os conselhos profissionais não devam integrar a estrutura da Administração Pública e de que a inscrição nos Conselhos não pode ser condição para o exercício profissional.
Essa é uma visão unânime entre os conselhos profissionais, como explica o conselheiro Paulo Dantas da Costa. “Diante da tramitação da PEC 108/2019, todos os conselhos de profissões regulamentadas se uniram em torno do “Conselhão”, que congrega os órgãos de classe, e têm procurado adotar um procedimento único no sentido de criar os obstáculos necessários para barrar o andamento dessa proposta que tem o claro objetivo de prejudicar os interesses das instituições responsáveis pela fiscalização profissional”, explica o economista.
“Os conselhos exercem um papel público que é notório e essa característica deve ser preservada. Somos muito diferentes de entes privados. A existência destas entidades é uma garantia para a sociedade, tanto de recurso quanto de referência”, afirma Lacerda.
O Cofecon está em constante esforço junto aos demais conselhos e à Frente Parlamentar de Apoio aos Conselhos Profissionais para traçar estratégias e executar ações com o objetivo de evitar a aprovação da PEC. No último dia 1º de junho, houve uma reunião remota, com a participação de aproximadamente 300 pessoas, entre deputados e representantes de conselhos federais e regionais.
O coordenador do Fórum dos Conselhos Federais das Profissões Regulamentadas, Mauro Kreuz, afirmou que na reunião foi aprovado com unanimidade o compromisso de trabalho uníssono do Fórum com a Frente no intuito de impedir a aprovação da proposta na CCJC. “Vamos trabalhar fortemente essa linha de pensamento junto aos conselhinhos, aos conselhos federais e aos deputados da Frente que compõem a CCJC”.
O coordenador da Frente, deputado Rogério Correia (PT-MG), afirmou que a pressão dos conselhos junto aos deputados foi fundamental para segurar a proposta até hoje e ressaltou que é preciso intensificar esse trabalho conjunto, ainda mais agora que o relator da PEC, deputado Edio Lopes (PL-RR), deu parecer favorável à proposta na CCJC. “De certa forma, fomos surpreendidos pelo relator com a admissibilidade. Agora temos que intensificar as conversas com os membros da Comissão para derrubá-la”, ressaltou o deputado.
Entre as estratégias do grupo, existe a tarefa dos conselhos regionais de mapear os parlamentares de seus estados que fazem parte da CCJC e agendar reuniões com eles a fim de reafirmar os argumentos que contrapõem a PEC. O deputado Rogério Correia, por sua vez, tem o compromisso de marcar audiências com a presidente da Comissão, Bia Kicis, com o presidente da Câmara, Arthur Lira, e com o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros.
O conselheiro Paulo Dantas da Costa realça a importância de todo o Sistema Cofecon/Corecons se engajar na luta contra a PEC 108/2019. “É fundamental que os conselheiros federais, bem como os regionais e os presidentes dos Corecons, se empenhem na atuação contrária a essa proposta. Precisamos buscar o apoio dos parlamentares para conscientizá-los sobre as consequências desse projeto, não apenas para os economistas, mas para todos os outros profissionais, sejam engenheiros, arquitetos, médicos, que exerçam atividades regulamentadas”, defende o conselheiro federal.
A transformação dos órgãos de classe em instituições de direito privado abre as portas para possíveis e prováveis conflitos de interesses no seio de uma atividade vital para a segurança e a qualidade de vida dos cidadãos brasileiros. O adequado exercício de fiscalização, executado com isonomia e visando única e exclusivamente o interesse público, tem os propósitos de proteger a sociedade e o meio ambiente, dar segurança às atividades econômicas, garantir a justiça e a ética nas relações sociais e no mercado de trabalho, além de conferir credibilidade para que a própria iniciativa privada possa realizar suas atividades com seguridade e confiança.
“A proposta gera um risco muito grande à sociedade na medida em que as atividades profissionais ficariam de fora do controle por parte de quem de fato entende das respectivas profissões. É inadmissível uma iniciativa dessa natureza. Os conselhos existem há muito tempo e vêm desempenhando há décadas um papel muito importante na ordem social”, argumenta Paulo Dantas da Costa.
O presidente do Cofecon ressalta. “Os Conselhos profissionais, ao regulamentarem as profissões, ao fiscalizarem sua atuação, ao instituírem seu código de ética, cujos pressupostos devem ser atendidospelos filiados, são uma defesa para a sociedade contra o mau profissional, contra o profissional não habilitado, porque alguém pode se dizer de uma profissão e não ter o preparo e a formação exigida pela lei”, aponta Lacerda.
Além de se tratar de uma proposta nociva às atividades desenvolvidas no país, bem como à segurança e, em última instância, à saúde e à vida da população, a PEC 108/2019 também é flagrantemente inconstitucional. A delegação da atividade de fiscalização só pode ocorrer de maneira limitada e secundária à ação da Administração Pública.
Esse entendimento fica claro em diversas deliberações do Supremo Tribunal Federal (STF), entre elas a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1.666. A delegabilidade do exercício do poder de polícia a entes privados também foi rechaçada pelo STF no julgamento do Mandado de Segurança (MS) nº 22.643, em 1998. A decisão proferida nesse último caso confirma a fiscalização do exercício profissional como “atividade tipicamente pública”, de competência exclusiva de ente autárquico de direito público, que tem legitimidade para exercer o direito de polícia, podendo punir e tributar. O mesmo entendimento foi aplicado pela Corte do STF no julgamento da ADI 1.717, em 2002.
A partir do entendimento de que o teor da PEC 108/2019 é lesivo e inconstitucional, o Cofecon reafirma o seu compromisso de zelar pelo exercício legal e ético da profissão do economista e de atuar em defesa do desenvolvimento econômico com justiça social. O Sistema Cofecon/Corecons seguirá empenhado no objetivo de barrar a PEC e dar publicidade ao tema e às consequências do projeto.
Confira a tramitação da PEC 108/2019 e posicione-se: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2211437.
Os Conselhos exercem uma função tipicamente de Estado e sua privatização levaria ao enfraquecimento do seus poderes fiscalizador e normativo.