ELOY CORAZZA
CORECON-DF Nº 4103
O objetivo do presente trabalho é apresentar as principais informações sobre a industrialização dos óleos vegetais, no Brasil, desde a capacidade industrial existente e sua distribuição assim como, em especial, a evolução do processamento da soja e dos produtos resultantes.
A soja é o produto mais relevante, sendo o grão de soja transformado em dois produtos básicos -, farelo de soja (cerca de 80%) e óleo de soja (próximo a 20%). O farelo de soja é hoje, no mundo, o insumo mais relevante para alimentação dos animais destinados à produção de carne para a alimentação humana, como de frangos, suínos, bovinos, peixes e demais animais, por conter nível de proteína elevado e de qualidade. Segundo descrição no portal da Embrapa:
“As proteínas da soja possuem alto valor biológico, assemelhando-se, portanto, às proteínas animais. A soja é o único vegetal que contém proteína completa, equivalente à do ovo, podendo ser consumida como fonte única de proteínas, tanto a curto como a longo prazo. O óleo da soja é rico em ácidos graxos poli-insaturados:linoléico (Omega-6) e Linolênico (Omega-3), e lecitina.”
Considerando ser o farelo de soja insumo imprescindível para a composição das rações tanto para criação como engorda dos animais – frangos, suínos e bovinos -, sem dúvida a industrialização do grão quando realizada próxima aos polos de produção dos grãos, pode vir a propiciar:
- criação e engorda desses animais por famílias, de baixa renda inclusive, e de forma integrada com os frigoríficos, através de método cooperativo e integrado entre indústria de soja, frigoríficos e criadores dos animais, de forma sustentável, econômica e propiciando estabilidade de renda;
- redução da concentração sazonal dos transportes da soja nas épocas da safra, com efeito de redução desses custos;
- ampliação das exportações de carnes, com agregação de valor à matriz de grãos e à de carnes e significativa redução nos custos de transportes.
Como se verificará, de 2010 a 2020 a quantidade de soja em grão exportada duplicou, enquanto a industrialização do grão de soja aumentou apenas 30%, tendo havido ainda gradual redução do refino e envase do óleo de soja.
Desta forma, cabe, sem dúvida, ampliar a análise com vistas a identificar eventuais fatores limitadores, como de regulação tributária e de outros encargos incidentes, com vistas a viabilizar a ampliação da industrialização da soja e a consequente produção de carnes, em substituição ao atual processo de crescente aumento das exportações da soja em grão.
Os dados referentes à capacidade industrial e à industrialização da soja são os disponibilizados pela Gerência de Economia e Estatística da Abiove (Associação da Indústria de Óleos Vegetais) em seu site, enquanto os dados referentes à produção da soja são os divulgados pela Conab.
1. A Indústria brasileira de óleos vegetais
1.1 Capacidade instalada (ano 2019)
Os dados estatísticos da Abiove (Associação Brasileira de Indústrias de Óleos Vegetais) apresentam, para o ano de 2019, a seguinte capacidade instalada distribuída segundo os três processos básicos de industrialização da soja – Processamento do grão, gerando farelo e óleo; Refino do óleo; e seu Envase. A seguir as informações sobre a capacidade instalada das indústrias de óleos vegetais no território nacional, em ton/dia, por Região.
A produção de grãos de soja na safra 2019/20 foi de 124,8 milhões de toneladas, havendo o processamento industrial de 46,8 milhões, isto é 37,5% da produção. A seguir a distribuição, por região do país, da produção de soja e da capacidade industrial de processamento sua produção instalada em cada região.
As regiões Sul e Sudeste são as que apresentam maior proporção de processamento, medida em Ton/dia, comparativamente à produção de soja (medida por milhões/Ton/ano), e as regiões Nordeste e Norte a menor proporção.
1.2 Unidades de processamento
No exercício de 2019, eram 124 as unidades industriais de óleos vegetais instaladas no país, das quais 25 se encontravam paradas e 99 unidades em funcionamento, estando assim distribuídas por Região do país.
Quanto à capacidade instalada de processamento das referidas unidades industriais, estas variam de unidades com capacidade de até 600 ton/dia até unidades com capacidade acima de 6.000 ton/dia.
A maior concentração da capacidade de processamento das oleaginosas, em 2018 e 2019, se dava nas unidades acima de 601 ton/dia até 4.000 ton/dia, que representaram, respectivamente, 80,3% e 84,5%, do total de processamento das oleaginosas.
1.3 Unidades de Refino e Envase
Com o processamento do grão de soja, resultam o farelo de soja, utilizado para ração dos animais e o óleo bruto da soja. Este óleo passa a seguir para processo adicional de refino e, ao final, de seu envase. Assim essas unidades estão mais relacionadas com o consumo humano.
1.4 Indústria de Óleos Vegetais
Evolução da Capacidade Industrial – 2009 a 2019
A capacidade industrial instalada nos 10 anos de 2009 a 2019, segundo dados da ABIOVE apresentou aumento de 11% no conjunto do processamento, refino e envase.
Ao se observar, porém, por fase do processo verifica-se que em 2019 o processamento equivalia a 116,1% da capacidade existente em 2009; já a capacidade de refino a 91,2% e a de envase a 85,8% daquela registrada em 2009, respectivamente.
A seguir compara-se a evolução ocorrida, de 2009 a 2019, na produção das cereais oleaginosas, matérias primas das indústrias de óleos vegetais, com a ocorrida na capacidade industrial de processamento, refino e envase. A evolução da capacidade instalada da indústria não acompanha o aumento ocorrido na produção dos referidos grãos. Foi acrescentada a produção de milho, em face do seu aproveitamento também como óleo de milho, passando assim também a integrar a indústria de óleos vegetais.
Na década observada, os dados indicam crescimento de 85,2% na produção dos cereais originadores de óleos vegetais, enquanto a capacidade instalada da respectiva indústria de óleos vegetais teve pequena variação de 11%.
A produção dos cereais canola e girassol apresenta redução enquanto ocorre significativo aumento na produção dos demais cereais oleaginosos, como o algodão 137,2%, a soja 85,7%, o amendoim 85,3% e o milho 83,1%.
Ao se comparar adicionalmente a industrialização dos óleos vegetais, em relação ao processamento do grão da principal oleaginosa, a soja, verifica-se ter havido apenas pequeno aumento de 16,1% no processamento do grão, mas com redução no refino do óleo bruto da soja e do respectivo envase.
2. A Soja brasileira: produção e industrialização – 2009 a 2020
2.1 Área, Produção, Produtividade
A soja é o cereal de maior produção da agropecuária brasileira, utilizando área de 38,5 milhões de hectares na safra de 2020/21 e gerando produção de 135,9 milhões de toneladas, com rendimento de 3.529 kg/ha, ou seja, de 58,82 sc/ha, o que supera a produtividade de todos os demais países produtores, sendo o segundo os Estados Unidos, com 53 sc/ha.
O processo de abertura do cerrado e de outras áreas como de pastagens degradadas, inicia sempre com o plantio da leguminosa soja até que o solo apresente mínimas condições para cultivo de outro cereal, como o milho, sendo então possível e viável dar início à rotação de cultura com soja na 1ª safra e milho na 2ª safra(safrinha).
A rotação de culturas na região do cerrado, com a 2ª safra com milho e/ou sorgo ou outro cereal sobre a área de soja colhida na primeira safra, avançou também de forma rápida: o plantio de milho ou sorgo na chamada 2ª safra ou safrinha, em 1979/80, era de 3% da área utilizada para soja, subindo na safra 2019/20 para 39% e para 41% na safra 2020/21, graças aos avanços no tratamento da terra, com o plantio direto e a rotação de culturas, o desenvolvimento e geração de sementes de soja mais precoces, a tecnologia dos equipamentos dos produtores, passando a plantar e colher mais em menos tempo.
2.2 Industrialização (processamento do grão de soja)
O grão de soja, apesar de conter apenas 20% de óleo em média, é a matéria-prima oleaginosa mais importante para a indústria de óleos vegetais no Brasil, sendo o óleo de soja o mais utilizado mundialmente para a alimentação. O óleo é ainda usado para fazer o biodiesel.
O óleo da soja é universalmente obtido por extração com solvente. O processo extrai do grão o óleo em bruto e o farelo de soja, este equivalente a 75% do peso do grão de soja, contendo 46% de proteína bruta, 80 % de proteína solúvel, 6,5% de fibra e 2,5% de óleo.
O farelo de soja é o mais utilizado para a nutrição animal, por ser rico nos teores de proteína bruta, e por isto ser importante ingrediente na composição das rações para avicultura, suinocultura e bovinocultura de corte e de leite, equinos e também na linha PET. O farelo de soja possui o melhor custo benefício para a composição da ração animal.
A seguir os principais dados de processamento do grão de soja registrados pela Abiove para última década de 2010/20.
No período 2010 a 2020, a produção de soja aumentou 59,0 milhões de toneladas, aumento de 85,7%, sendo que os grãos destinados ao processamento industrial aumentaram 31,9% contra acréscimo de 185% nas exportações de grãos.
Em contrapartida, o sub produto farelo teve aumento na produção de 33,4%, sendo que o farelo destinado ao consumo interno cresceu 44,4% frente ao aumento de 23,9% no farelo exportado.
Em relação ao óleo bruto, cuja produção aumentou 38,0 % na década, o consumo interno ampliou em 60% enquanto o volume exportado apresentou redução de 30%. O consumo interno de óleo bruto voltado para a produção de biodiesel aumentou 133,6% neste decênio.
A cadeia produtiva “ex ante” é extremamente importante, uma vez que está ligada à necessidade de conhecimento e de capacidade operacional com tecnologias diversificadas, e a cadeia “ex post”, em especial do farelo, é basilar para viabilizar a expansão do mercado de produção e industrialização de carnes, demanda efetiva do mercado internacional que tem motivado tão forte crescimento na demanda internacional pelo grão de soja.
Quais as razões ou fatores que tem obstaculizado o crescimento da indústria de processamento da soja e da correspondente ampliação das exportações do farelo, de óleo, de biodiesel em substituição a esse gigantesco aumento das exportações de grãos, bem como ao fraco aumento no consumo interno do farelo da soja?
Alguns pontos chamam a atenção e cabe aqui seu registro para uma análise mais detalhada em relação às oportunidades e problemas a serem analisados, como:
- O significativo e rápido aumento das exportações do grão de soja indica a forte necessidade do mercado internacional pela oleaginosa, estando, pois, ligado à produção de alimentação humana e dos animais, devido à qualidade da proteína do farelo;
- O insignificante aumento no processamento do grão com certeza indica a existência de limitações, não decorrentes da produção, para ampliar tanto o mercado interno de farelo e de óleo bem como da exportação desses dois subprodutos da soja, em particular do óleo refinado cuja exportação foi reduzida.
Fontes:
- ABIOVE – Brasil Complexo Soja. Gerência de Economia, 16-03-2021.
- ABIOVE – Capacidade instalada da indústria de óleos vegetais, 2019. Gerência de Economia e Estatística.
- ANP/ABIOVE – Brasil – Biodiesel. Produção de Biodiesel por matéria prima, 11/08/2021. Coordenadoria de Economia e Estatística. Dados disponíveis até junho/2021.
- CONAB – Série Histórica de área plantada, produção e produtividade. 1976/77 a 2020/21.
Eloy Corazza, entrou em julho/1970 como AFTF no Ministério da Fazenda, primeiro Coordenador de Cursos da ESAF (1976-79); Diretor Geral de Pessoal, Secretário de Controle Interno do Min dos Transportes, Secretário de Normas da STN – Secretaria do Tesouro Nacional, Secretário Geral-Adjunto de Administração do MF, Secretário de Recursos Humanos do Poder Executivo, Secretário Executivo do Min. de Transportes e Comunicações (1992); Secretário de Controle Interno do Ministério do Planejamento e, após aposentado, Diretor Financeiro da Rede Sarah de Hospitais e Presidente do Sarahprev; além de Secretário Geral do Conselho de Arquitetura (CAU) e Diretor Financeiro da CODHAB/DF. Formado em Economia, Filosofia e Pedagogia. Professor de Economia, da Faculdade Católica/Bsb e da Unisinos, no período de 1972 a 1985.
“Os conteúdos dos textos publicados, artigos e notas, além dos comentários do público, são de responsabilidade exclusiva de seus autores e signatários, não envolvendo ou refletindo posicionamentos ou opiniões do CORECON-DF.”
Talvez uma das razões para a baixa demanda interna do farelo seja ainda a criação extensiva de animais para corte. Quanto ao fraco interesse estrangeiro pelo óleo, seria interessante pesquisar os principais países compradores (como está o consumo e de onde adquirem o produto). Talvez encontremos um mercado já atendido e sem interesse pelo produto. Daí a alternativa seria os países onde existe carência de fornecedores. Mas esses pagariam o preço de interesse do exportador? Outra questão interessante é o custo do frete para exportação do grão processado.